Assim
que resolvi ficar, o céu não estava azul. Fiquei porque quis pensar melhor no
que faria depois dali. Dentro da paisagem me cabia um olhar singular e havia
ternura como limite, e depois mais nada. Talvez as mágoas de uns frios pensamentos.
A
cidade parecia pequena, e perto da estação sentei num banco de rua. Uma árvore
próxima abrigava corvos e seus ninhos. Era início da primavera e pareciam
agitados. A cidade parecia morta. Aos poucos o calor diminuía e as parcas casas
iam fechando suas portas. Um silêncio parecia me engolir. Fiquei sentada no
banco até o anoitecer. Abri o vinho e tomei dois goles num copo de vidro. Minha
boca gordurosa havia marcado a transparência vazia de sua borda. As aves mais
graúdas bicavam as menores. Os filhotes negros abriam os bicos aguardando
minúsculos pedaços de carnes trazidos pelas fêmeas.
O
céu voltou a ficar azul, adornando as extremidades das árvores sem folhas. A
primavera ainda não havia coberto a vegetação por inteiro. Fui bebendo e
apreciando aquele som espremido e esganiçado, alto, feito de brigas e alegrias.
Havia um tapete de merdas espalhados no chão úmido.
Os
ninhos eram bem tecidos e balançavam como sinos suspensos. Apesar do frio, o ar
estava seco e o sol ainda brilhava. Brindei minha solidão em toda aquela
vastidão de campos. Os charcos retinham coaxos. A primavera trazia fartura. Algumas
flores davam vida à terra. Suas cores misturavam-se aos espaços limpos dos
campos. Fiquei ali até o sol se pôr.
Atravessei
a rua até o albergue onde me hospedara. Uma casa branca com janelas azuis. Ao
seu redor, uma grama crescia desordenada. Dormi numa antiga enfermaria, numa
cama de campanha. Meus aposentos não foram dos mais agradáveis. Acordei ao o
som da fome dos filhotes dos corvos, deitados nos ninhos da acolhedora árvore
do caminho.
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